“Dentro do meu apartamento, o sinal era ruim. Então ia para a varanda falar ao telefone. O vizinho do prédio ao lado sempre ia para sua janela ficar me olhando. Até que ele tirou a roupa”, este é o relato da jovem Thaiane Santos, de 25 anos. Assédio, importunação sexual e invasão de privacidade não são delitos tão incomuns em condomínios residenciais.

Recentemente, na noite do dia 1º de junho, outro acontecimento envolvendo moradores. O gerente de uma casa de eventos infantis foi flagrado capturando imagens de mulheres com auxílio de um drone em um condomínio no bairro do Cabula, em Salvador. No equipamento foram encontradas cerca de 1.800 imagens dos condôminos em momentos íntimos. O homem não era morador.

O sentimento de Thaiane era de constrangimento. Demorou para que ela acreditasse no que tinha acontecido. A jovem explica que, por conta da diferença de altura entre os andares, ela não conseguia ver o rosto do rapaz, isso só era possível quando ele abaixava “para ver se o alvo ainda estava ali”. A solução foi evitar utilizar a própria varanda ou sair correndo quando percebia a presença do vizinho.

“Não cheguei a denunciar para a administração do prédio porque não tinha provas. Tentei filmar, mas, com o nervosismo, não ficou nítido. E tinha medo. Ele sabia onde eu morava, que horas eu saía. Tinha medo que ele fizesse algo comigo”, desabafa a jovem.

De acordo com o presidente da Secovi-BA – sindicato representante da administração de condomínios –, Kelsor Fernandes, apesar de ser um comportamento antissocial, o máximo que o síndico pode fazer, em casos como esse, é uma circular ou notificação de mau comportamento, pois o morador estava dentro da própria residência. Do ponto de vista jurídico, no entanto, o presidente da Comissão de Direito Imobiliário e Urbanístico da OAB-BA, Gustavo Amorim, frisa que o caso viola regras básicas de convivência social que devem estar no regimento interno do condomínio. Para ele, o síndico precisa levar o assunto à assembleia de condôminos, que pode deliberar uma penalidade prevista nas normas internas do local.

“A gravidade do comportamento pode também justificar uma manifestação junto à autoridade policial. Nesse caso, seria importante o registro no livro de ocorrências do condomínio como prova. A intimidade ou privacidade da moradora é matéria que a Constituição e o Código Civil brasileiros determinam que seja preservada. Ainda que numa morada coletiva, como é um condomínio”, explica o presidente.

Gustavo Amorim esclarece ainda que a vítima pode pedir indenização por danos morais. O valor dependerá, segundo o advogado, da prova e do dano que representa o assédio.

O advogado criminalista Luiz Gabriel Neves explica que existem leis para punir atos que violem a intimidade, a vida privada e a dignidade sexual das pessoas. De acordo com Neves, o Código Penal prevê como crime praticar ato obsceno em lugar público, aberto ou exposto. “Já existem precedentes de tribunais que consideram como crime a exposição dolosa de órgãos genitais em local visível ao público, como na área externa da própria casa, por exemplo”, esclarece o criminalista.

Para os moradores que ficam espiando as vizinhas com binóculo ou outros instrumentos, o advogado Gustavo Amorim esclarece que este é um comportamento violador de intimidade. Ele aconselha que a vítima comunique ao síndico, para que ele possa aplicar notificações ou multa, caso o local aja dessa forma. “Depois, precisa também comunicar à autoridade policial, que teria uma maior gama de medidas: como apreensão dos instrumentos utilizados, instauração de inquérito policial e até a prisão em flagrante do indivíduo que insiste na conduta, se houver prova robusta da prática”, aconselha Amorim.

De prisão a multa

Já com relação ao caso do drone, segundo Kelsor Fernandes, se o rapaz fosse morador do local, o síndico poderia utilizar o regulamento para impedir que o equipamento fosse utilizado nas áreas do condomínio. O advogado criminalista explica que, além disso, produzir, fotografar, filmar ou registrar conteúdo de cena de nudez ou ato sexual, sem autorização, é crime previsto no Código Penal, com pena de seis meses a um ano e multa. No entanto, Neves adverte que geralmente é exigido registro da imagem e a mera observação pode não ser punida.

“Qualquer pessoa vítima desses crimes pode procurar a delegacia responsável ou o Ministério Público para noticiar o fato, de modo que se inicie uma investigação criminal para produzir prova da materialidade do crime e indícios suficientes de quem foi o autor”, finaliza Neves.

* Sob a supervisão da editora Cassandra Barteló

O QUE FAZER EM CASO DE INVASÃO

Comunicar à administração do condomínio  
O primeiro passo é relatar o ocorrido ao síndico ou à administração do condomínio. A partir disso, uma  notificação ou uma circular podem ser feitos para alertar o morador responsável pelo mau comportamento violador da intimidade ou privacidade do vizinho. O síndico pode também levar o ocorrido para a assembleia de moradores e, caso o condomínio aja dessa forma ou conste no estatuto,  decidir pela aplicação de uma multa
Comunicar à autoridade policial 
Pessoas que foram vítimas desses crimes podem procurar a delegacia responsável ou o Ministério Público para noticiar o ocorrido. A partir disso, pode ser instaurada  investigação criminal para produzir provas do crime e indícios de quem foi  autor. Além disso, a autoridade policial pode também apreender os instrumentos utilizados e, em caso de insistência  e provas robustas,  promover a prisão em flagrante 
Provas do fato 
É importante que o acontecimento esteja registrado no livro de ocorrências do condomínio, isso servirá como uma das provas. Já em casos de registro de momentos íntimos, geralmente exige-se a imagem

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